Em duas entrevistas que tive acesso,
feitas por uma moradora de Diamantina, em 1995, relacionadas a Juscelino Kubitschek de Oliveira - 1902/1976 - e à cidade de
Diamantina, com Otto Paulino e Walmy Lessa,
contemporâneos e amigos dele, pude captar melhor como era o homem JK. É bom salientar que não sei sobre o atual paradeiro dos dois entrevistados. Assim, vou me ater as partes das entrevistas como feitas à época.
Para entender melhor as colocações dos dois entrevistados, é bom
que se diga que Otto Paulino é engenheiro geológico, natural de Araçuaí, mas
residente em Diamantina, e se diz apartidário. Já Walmy Lessa é advogado,
natural de Diamantina e se diz um homem ligado à política. Na época em que
existia a União Democrática Nacional (UDN), Walmy militava em suas fileiras.
Na entrevista, Otto frisa que a personalidade de JK era confusa. Entretanto, como
homem, era do tipo excelente, um homem bom. Mais a frente, Otto analisa JK como
um homem que tinha complexo de inferioridade, razão pela qual possuía, a seu
ver, como compensação psicológica uma visão de mundo megalomaníaca. Walmy
coloca que o traço marcante de JK era do homem não corrupto. Coloca ainda que
JK possuía um “espírito jovial”, o gosto pela valsa, pela champanhe, pela
cervejinha e, principalmente pelas mulheres.
Em relação ao estilo de se vestir, quando
vinha passar uns dias em Diamantina, Walmy conta que JK sempre andava de
camisa, paletó e gravata. Para o entrevistado, na época só se andava assim.
Quem não andasse assim, não era gente.
O gosto pela seresta era outra marca de
JK. A esse respeito, Walmy fala que ele ia cantar, tirar foto, fazer
serenatas no Cruzeiro, que fica no alto de uma pedra que dá vista para uma boa
parte da cidade. Quando destas serestas, JK requisitava os melhores seresteiros
de Diamantina através de Ernesto Roque, um grande seresteiro, e, também, trazia
gente do Palácio da Liberdade, quando era governador.
Percebe-se, através das
entrevistas, que JK realmente era um homem com carisma, qualidades extraordinárias
que despertam a atenção ou a consciência das massas. Apesar das falhas dele em
outros campos, o “homem JK” era sempre preservado
pelos amigos.
Como crescera num ambiente humilde,
embora digno, conforme dito em suas memórias, JK sonhava em ser alguém na vida.
Nesta passagem de suas memórias fica
explícito esse caráter “... passaram-se anos. E eis que aquele menino, então
homem iria voltar já formado em medicina... A oportunidade era excelente para
que todos constatassem a diferença. Seria a hora da auto-afirmação de quem
viera do nada e que retornava para disputar um lugar ao sol entre os seus
irmãos de berço.”
A infância pobre, de forma circunstancial
e não “natural”, como o próprio JK fala em suas memórias, o levou a viver sob
paradoxo: se por um lado era oriundo de famílias com uma certa tradição, por
outro lado, vivenciava e vivia de forma simples, sem a
menor regalia, de forma não deliberada, mas imposta pelo destino. Quem consegue
viver ou sobreviver nesse limite, adquire uma visão das coisas de forma “sui
generis”. Já outros... não conseguem: ora adere ao mundo dos menos favorecidos
de forma comodista ou como
revolucionário; ora adere a elite tradicional e torna-se um exemplo de
conservador, ou seja, “mais realista do que o rei”; há, ainda, os que sucumbem
em mentiras para manter um “status” aparente ou, também, os que ceifam a
própria vida devido as dificuldades de se situar num mundo extremamente
contraditório.
JK, dada a sua destreza para entender as
coisas, absorveu o que os “dois mundos”, a seu ver, tinham de melhor: a
humildade dos pobres e a capacidade de articular nos bastidores, algo corriqueiro da elite.
A formação religiosa, a educação
conservadora dada pela sua família, fornecia elementos para que JK conseguisse
superar a infância pobre em Diamantina. A estes elementos externos somou-se o
contato com a cidade grande como Belo Horizonte, a formação em medicina, a viagem a vários
países da Europa, África e Ásia, a entrada para a oficialidade da Polícia
Militar mineira como capitão-médico e a participação no combate travado entre
Minas Gerais e São Paulo na Serra da Mantiqueira, mais precisamente na cidade de Virgínia/MG, na Revolução
Constitucionalista de 1932. É evidente que todos nós temos as nossas vidas
permeadas por diversos fatores. Entretanto, o que varia é a disposição e
importância dos fatos acontecidos em nossas vidas. No caso de JK, a disposição
dos fatos acontecidos em sua vida é visto dessa forma em suas memórias: “É
interessante como a urdidura de uma existência humana se constitui de numerosos
pequenos fatos que, na maioria das vezes, parecem não ter significação alguma.
Escalonados no tempo, em datas diversas, vão-se, entretanto, encaixando uns nos
outros, em seqüência imprevisível mas lógica, até que, fundidos, se transforma
nas vigas mestras de um destino.”
Como diz em suas memórias, JK via na
possibilidade de estudar medicina a chance de se tornar “doutor”. Igualmente,
a possibilidade de diminuir o sofrimento humano. Aqui, fica evidenciado o
caráter humano da pessoa de JK.
Após essas breves colocações acerca da
pessoa de JK, surge uma questão: qual é mesmo a melhor definição do homem JK? A
resposta, a meu ver, está nos interlocutores que tiveram acesso a ele ou,
também, em nós observadores e/ou conhecedores de facetas de sua vida. Para Otto
Paulino, que é formado em engenharia e se diz apartidário, o homem
JK é visto sob o ângulo técnico, ou seja, o administrador. Para Walmy Lessa, que é advogado e antigo militante da UDN, o homem JK é
visto basicamente sob o ângulo político. Para as famílias humildes que eram
visitadas por JK em Diamantina quando ele ia àquela cidade, o homem JK era visto,
certamente, como um médico que dava consulta gratuita. Para os seresteiros de
Diamantina, o homem JK era visto como o amante da seresta...
Como se vê, é a faceta que melhor, ou
tão-somente, temos conhecimentos que marca a personalidade de uma dada pessoa.
Luiz Fernando da Silva
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