quarta-feira, 16 de julho de 2014

BREVE HISTÓRIA DE MEIO SÉCULO NO CHILE - FINAL

A Igreja Católica, o militarismo e o movimento popular

A Igreja 

Em relação à Igreja Católica, há que se atentar para o fato de que a mesma insere-se no contexto do colonialismo, já que era parte integrante umbilicalmente dos Impérios Ibéricos. Dessa forma, a atuação da Igreja Católica dava-se como crença pura e simples ou como projeto de dominação em relação às regiões colonizadas, dependendo, assim, do ponto de vista do analista.
Como de praxe, a Igreja Católica, doravante Igreja, na década de 30, apóia o candidato das oligarquias e membro do Partido Radical Juan Estéban Montero à presidência da República.
Ricardo Donoso, historiador, frisa que no final da década de 50, no governo de Jorge Alessandri, havia relação bem articulada das classes dominantes, executivo como representação das potências dominantes, plutocracia e Igreja, a despeito do Congresso e das classes populares.
Os autores, a respeito das relações espúrias da Igreja em 1964 com o poder, colocam: “A Democracia Cristã, partido policlassista, com uma importante base social pequeno-burguesa, mas dirigido por representantes da burguesia, tornou-se o melhor instrumento da nova estratégia do imperialismo, abençoada pela Igreja Católica. Esta, desde o término da Segunda Guerra Mundial, havia abandonado sua aliança tradicional com a oligarquia latifundiária para dar seu apoio ao novo que surgia com o predomínio norte-americano na América Latina.
No final da década de 30 surge o Partido Democrata Cristão-PDC ou simplesmente Democracia Cristã a partir dos ideais do filósofo neotomista Jacques Maritain, ou seja, à moda da Falange Espanhola. A Democracia Cristã tinha, também, como fonte de inspiração, as Encíclicas Papais. Dessa forma, repelia os ideais marxistas e, também, liberais.

O militarismo 

O governo de Arturo Alessandri na década de 20, dado a sua atuação contra as oligarquias, faz emergir uma corporação que se tornará permanente na história política do Chile: a juventude militar. Entretanto, uma junta militar, que não era juventude militar, depõe Alessandri e repõe as oligarquias no poder, as mesmas que haviam sido afastadas em 1920. Algum tempo depois, mais precisamente 04 meses, a juventude militar, através de Carlos Ibañez e Marmeduque Grave, consegue substituir a junta militar por outra. Como a juventude militar era apoiada pelos alessandristas, a mesma garantiu o retorno de Arturo Alessandri ao poder constitucional. Dessa forma, houve a promulgação de uma nova constituição que acabava de vez com o parlamentarismo no Chile.
A nomeação do coronel Ibañez para o Ministério do Interior garantiu de vez a interferência militar na política chilena.
Apesar da nova eleição que levou ao poder oligarquias corporificada em Emiliano Figueroa, Carlos Ibãnez continua como Ministro do Interior dado a força que adquirira no governo anterior.
Um ano e meio depois, Emiliano Figueroa renuncia e o coronel Ibãnez, que era Ministro do Interior, torna-se vice-presidente, cargo que ocuparia a vaga de presidente dado a renúncia deste, e logo a seguir elege-se presidente da República em 27 de maio de 1927. Dessa forma, os militares que haviam entrado na cena política devido a crise de hegemonia dos setores tradicionais, tornam-se os novos atores permanentes na vida política do Chile.
O agora general Ibãnez torna-se ditador por um período de quatro anos e cai em 26 de julho de 1931 devido a um grande movimento de contestação militar.
No dia 04 de julho de 1932, devido ao gérmen da doutrina socialista que se espelhava e a associação desse movimento com o descontentamento de militares jovens, o brigadeiro do ar Marmeduque Grave proclama a “República Socialista”, que dura apenas doze dias.
Há na história do Chile, como em todos os países subdesenvolvidos, o mito de que as forças armadas são imprescindíveis. Dessa forma, a partir de 1924, com a junta militar que destituiu o presidente Arturo Alessandri, inicia-se os ciclos de intervenções das forças armadas na vida política chilena através de intentonas ou conspirações abortadas.
A doutrina Schneider, embora partisse do ideal de respeito à constituição chilena, não conseguiu deter as intervenções militares na política. Entretanto, é interessante ressaltar o respeito à ordem vigente de militares como René Schneider e Carlos Prats, ou seja, uma doutrina profissionalista das forças armadas.
A articulação conspiratória fez de tudo para minar a doutrina profissionalista das forças armadas. Entre os seus atos, estava o assassinato de Schneider e Prats no início dos anos 70. A partir daí, os conspiradores aproveitaram as desconfianças do corpo de oficiais em relação ao governo de Allende bem como a formação desses oficiais nas academias dos Estados Unidos.
Em 11 de setembro de 1973, os conspiradores, através do apoio das forças armadas conseguem tomar o poder no Chile. Salvador Allende é morto no Palácio La Moneda.
O chefe autonomeado das forças armadas, Augusto Pinochet, torna-se o ditador do Chile. De início, a ditadura de Pinochet já demonstra a sua vertente totalitária, ou seja, o fechamento do Congresso, cerceamento das liberdades democráticas, limitação da justiça, proscrição dos partidos políticos.
O que estava em jogo era o restabelecimento do poder da burguesia chilena e da “democracia burguesa”, embora, para tanto, houvesse a supressão das liberdades democráticas no sentido popular e também burguesa.

O movimento popular

A meu ver, a guerra civil de 1891 teve um papel fundamental no sentido de criar um sentimento de participação popular. Em outras palavras, é um momento de caos generalizado que se engendra a necessidade da participação de todos, seja para vencer os oponentes, seja para acabar com o caos corporificado num ambiente de guerra.
Para exemplificar essa colocação, os próprios autores afirmam: “...O movimento operário, que já havia dado seus primeiros passos em finais do século passado começou também a adquirir personalidade própria, conquistando um lugar destacado na política nacional.”
Dentro desse aspecto sócio-político, a vitória de Arturo Alessandri em 1920 representou a vitória das camadas populares em relação ao poder oligárquico.
Aliado às camadas populares, estava a juventude militar que impulsionou o país para a vitória insurrecional de 1932.
A efêmera República socialista proclamada em 1932, que durou apenas 12 dias, é uma demonstração evidente das forças populares no Chile.
A vitória das forças populares, Frente Popular, em 25 de outubro de 1938 demonstra que o veio socialista não era somente efêmero. Nos próximos 20 anos, o Chile será um dos poucos países do terceiro mundo a ter governos populares através do sufrágio universal.
Um aspecto interessante na história política chilena, e que também demonstra desenvolvimento político, é o populismo de Carlos Ibañez ter surgido com ele e desaparecido  com a sua morte. Também podemos colocar nessa mesma situação o populismo de Arturo Alessandri.
Devido ao processo de acumulação de forças nos setores populares, o Chile demonstra, através da Unidade Popular, que era realmente uma nação desenvolvida politicamente. A propósito dessa colocação, o economista Aníbal Pinto afirma que o Chile tinha uma “...contradição entre uma estrutura econômica subdesenvolvida e uma organização política avançada...”. A eleição, pelo voto, do socialista Salvador Allende é uma demonstração do processo de acumulação de forças dos setores populares.

Conclusão

Em que pese os possíveis vieses de uma história a partir de uma dada concepção normativa, fiquei muito impressionado com a história de luta do povo chileno.
As contradições explicitadas pela superexploração do trabalho nas minas, principalmente, da guerra civil e do imperialismo e neocolonialismo, forjaram no povo chileno a capacidade da indignação e consequentemente do caminho a ser trilhado, se quisessem, de fato, a emancipação ante os grilhões.
O “jeitinho”, tão característico das negociatas em nosso país, não era suficiente num país que conheceu a guerra civil. Isso não quer dizer, evidentemente, que a guerra civil seja uma panacéia. Mas o acirramento das contradições foi o fio condutor das rebeldias das camadas populares.
Todas as vicissitudes políticas enfrentadas de forma corajosa pelo povo chileno, a partir do final do século passado deram-lhe uma característica “sui generis” no contexto latino-americano: o sentimento de cidadania. Para exemplificar esse fato, basta citar algumas conquistas desse povo: sufrágio universal desde de 1874, com direito de voto a todos homens, mulheres e analfabetos, que estivessem inscritos nos registros eleitorais; multipartidarismo; universidade desde 1842; lei de educação primária desde 1919.

Finalmente, o que evidencia de forma peremptória o desenvolvimento político do Chile foi a capacidade de almejar e, de certo modo, conseguir por um período de três anos, a implantação do socialismo marxista através do voto, dentro da vigência constitucional. Esse fato, a meu ver, não é somente caso único na América Latina, mas em todo o mundo “civilizado”.

Luiz Fernando

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