A consciência é um fenômeno complexo e
intrigante. Talvez, a ela estejam relacionados os maiores problemas da história
da Filosofia, da Psicologia e das chamadas Neurociências.
O que é a consciência? Qual a sua
relação com o cérebro? Ela é produto do cérebro ou ela produz o cérebro? Se ela
for produto do cérebro, como este a produz? A consciência cria o mundo ou ela
reflete o mundo em que vivemos? O mundo existe sem a consciência? Com a morte
do corpo, a consciência sobrevive ou é com ele extinta? Quais são os limites da
consciência? Ela tem limites? Todas essas são questões de grosso calibre e, na
tentativa de respondê-las, diversas escolas de filosofia e psicologia foram
fundadas.
O debate sobre as questões envolvendo a
consciência continua vigoroso. É comum vermos na mídia reportagens sobre o
tema. Revistas especializadas e de divulgação científica, programas de
televisão, inúmeros livros, séries e documentários comumente tratam da temática
da consciência. Todavia, mesmo sendo tão amplamente abordada em estudos e
discussões, a consciência ainda guarda seus mistérios, ou, melhor dizendo, ela
ainda, em muitos sentidos, consiste num grande enigma a ser desvendado por
cientistas e filósofos. Mas, sobre isso, conversaremos em outra ocasião. Hoje,
iremos falar sobre um outro aspecto da consciência, um aspecto mais relacionado
à psicologia.
O filósofo e sociólogo francês Edgar
Morin, em seu livro Os sete saberes
necessários à Educação do Futuro introduz o aspecto da consciência do qual
iremos tratar. Citando Marx, afirma Morin que “os produtos do cérebro humano
têm o aspecto de seres independentes, dotados de corpos particulares em
comunicação com os humanos e entre si”. E ele completa: “as crenças e as ideias
não são somente produtos da mente, são também seres mentais que têm vida e
poder. Dessa maneira, podem possuir-nos”.
Essas citações feitas pelo pesquisador
francês mencionado fazem referência a um aspecto da fenomenologia da
consciência, ou seja, elas falam de algo que acontece com a consciência como
ela se nos apresenta, da maneira como a experimentamos. Esse aspecto é a
independência que nossas crenças parecem ter sobre nós mesmos em muitas
ocasiões. Aqui, a análise que está sendo feita diz respeito ao modo como nós,
seres humanos, experimentamos nossa consciência e sobre os efeitos dessa
experiência sobre nós mesmos. Enfim, estamos falando de psicologia, mesmo
considerando que a noção de independência das ideias tenha implicações
sociológicas e filosóficas.
Mas, o que tem haver a alegada
independência de nossas crenças e ou ideias como o título deste artigo? Muita
coisa. É comum afirmarmos que não nos importamos com o que as pessoas dizem, que não estamos nem aí pra isso. Mas, será que não
mesmo? Será que somos capazes de não atribuirmos nenhum valor ao que as pessoas
pensam sobre nós? Será que somos capazes de sermos totalmente livres da opinião
dos outros?
De fato e sem rodeios, preocupamo-nos
sim com o que as pessoas irão dizer ou pensar sobre nós. Isso, inclusive é um
dos pilares do contrato social, sem o qual a vida em sociedade seria
inviabilizada. Ou seja, temos em nós a crença de que devemos nos comportar
dessa ou daquela maneira para termos a aprovação de nossos pares ou de
determinadas pessoas ou para que elas não pensem isso ou aquilo de nós. Isso
pode ser verificado num ato de carinho para com um amigo ou para com a pessoa
amada, no respeito à propriedade alheia, no tato que temos em nossos contatos
sociais e por aí vai. Se não tivéssemos a desagradável sensação causada pelo
constrangimento que surge diante de uma reprovação feita por outra pessoa sobre
os nossos comportamentos, as coisas seriam bem diferentes. Com certeza! Dizem
os entendidos que os psicopatas não têm esses constrangimentos. Aí, dá pra se ter
uma noção de como as coisas seriam em um mundo onde ninguém se importasse com o
que as pessoas vão dizer ou pensar umas das outras...
No entanto, há extremismos patológicos.
Em termos clínicos, muitas psicopatologias graves como depressão e transtornos
de ansiedade estão relacionadas à preocupação exagerada com a avaliação de
terceiros. Muitas pessoas adoecem devido ao medo paralisante que sentem diante
da opinião de outras pessoas sobre elas. Algumas ficam completamente
paralisadas somente com a possibilidade de virem a ser avaliadas pelos outros.
E não estamos falando aqui de avaliações complexas não. “O que irão dizer da
minha roupa?” “O que irão pensar da minha aparência, do meu modo de andar e de
falar?” “O que irão achar das minhas idéias?” “O que vão pensar de mim se eu
falar a verdade ou der a minha opinião sincera?” “Será que me considerarão
burro, feio, inadequado?”. “Se eu for espontâneo, será que irão me excluir ou
pensarem que sou chato e estraga-prazeres, do contra, encrenqueiro?”.
O jogo social não é fácil. Parece que
vivemos em uma luta constante entre agradar as pessoas e satisfazer-lhes as
necessidades e sermos agradáveis conosco mesmos e satisfazer nossos interesses.
Ocorre que, às vezes, as nossas crenças adquirem uma independência patológica.
Nesse caso, elas, como bem disse Morin, passam a nos possuir. No entanto, a
posse da qual estamos aqui falando é aquela destrutiva e incapacitante. Quando o
juízo que as pessoas irão fazer de nós se torna um fardo excessivo, algo
angustiante e acompanhado de muita ansiedade; quando deixamos de frequentar
certos lugares por medo de sermos avaliados; quando evitamos pessoas para que
elas não nos avaliem, podem ser sinais de que as coisas não estão indo bem.
Nesses casos, nossas crenças ou ideias podem estar se tornando destrutivas para
nós mesmos. Aqui, cabe uma questão: como ou quando as nossas crenças ou ideias
tornam-se destrutivas ou patológicas? Elas se tornam destrutivas ou patológicas
quando não percebemos que elas não são seres independentes de nós mesmos, como
se fossem homúnculos que estão dentro da nossa cabeça. Nossas crenças nos
corroem e incapacitam quando perdemos a capacidade de questioná-las, de debatermos
com elas.
Preocupamo-nos sim com o que os outros
pensam ou irão pensar sobre nós. É natural e necessário que seja assim. No
entanto, essa preocupação não deve perder de vista a relatividade do que
pensamos. Nossas crenças e ideias resultam da nossa interação com o mundo. O
mundo transforma-se constantemente. Também nós devemos ficar atentos para que
nossas crenças e ideias não se solidifiquem e se tornem obstáculos para a nossa
vida social e também para a nossa satisfação e contentamento pessoal.
João Paulo Braga Floriano
Mestre JP! Ótima interação entre o "eu" e a vida cotidiana. Irving Goffman, sociólogo americano, coloca também, no seu livro sobre a dramaturgia social, essas dificuldades que temos nessa interação.
ResponderExcluirPrezado Luiz Fernando,Boa noite
ResponderExcluirGostei do texto, como lido com politica partidária, o que pensam a respeito das pessoas é muito importante,cada pequeno gesto e detalhe "Fala" pois é decisivo eleitoralmente falando.
Tenho alguns textos elucidativos que gostaria de partilhar contigo oportunamente.
Prezado Ascânio! Bom dia! Primeiramente, obrigado por compartilhar comigo deste Blog. Como você viu, o texto acima é de meu amigo e colaborador João Paulo. Ele é um inquieto analista, psicólogo atuante e colega de TJ. Eu e ele estamos interagindo aqui na macro e micro análise social. Sobre seus textos, se eles estiverem dentro da concepção do Blog, como demonstrado na apresentação acima, serão bem-vindos, sim. Abraços
ResponderExcluirÓtimo texto tio, parabéns ao autor!!
ResponderExcluir