quarta-feira, 14 de agosto de 2013

SOBRE O PENSAMENTO E A AUTONOMIA




Analistas dos costumes e dos comportamentos atuais, como o sociólogo polonês Zigmund Bauman, apontam para um fenômeno curioso sobre as tecnologias hodiernas de comunicação, especialmente sobre a internet. Segundo eles, os meios atuais de conexão entre as pessoas propiciam a elas estarem próximas de muitas outras pessoas. É possível, por exemplo, nas redes sociais, o estabelecimento de contato com pessoas que estão muito longe geograficamente, até com aquelas que estão em outros países. Quase todo mundo tem um computador com internet em casa, e é coisa rara, indício inclusive de perturbação mental, dizem os mais afoitos, a pessoa não ter email, facebook, skype e tantos outros por aí. Há ainda os iphones, ipads e androids da vida. Estes conferem mobilidade e versatilidade à conectividade.
Numa mesa de bar, numa reunião de amigos, num almoço em família, nas salas de espera e até nas salas de aula estão lá os plugados no mundo virtual (aqui, só pra não deixar passar a oportunidade, abramos este parêntese e digamos de passagem: como é chato e desagradável numa reuniãozinha de amigos, num bar, por exemplo, uma pessoa que está agarrada a um celular e não pára de olhar para ele e não pára de teclar e tira foto o tempo todo para postar no face). Ó céus! Pior ainda é quando ela fica chamando outras pessoas para virem participar do evento e passa o tempo todo assim. Para dizer o mínimo, acho uma atitude brega. Mas... paciência é o que resta numa hora dessas. Enfim, vivemos na era da comunicação. Estamos conectados quase o tempo todo.
Só que, de acordo com esses mesmos analistas - e aí reside o fato curioso que eles apontam, mesmo tão próximas, as pessoas estão cada vez mais isoladas. Como se vivessem em ilhas virtuais. O que se verifica é que a virtualização das relações, curiosamente, gera distância entre as pessoas. A regra é mais ou menos esta: quanto mais conectadas, mais encapsuladas e mais distantes as pessoas ficam umas das outras.
A internet tem o poder sim de conectar milhões de pessoas sem precisar do encontro físico e material entre elas. Só que, exatamente por isso, a realidade concreta torna-se prescindível, ela pode ser dispensada. Uma realidade virtual passa a vigorar nesse contexto. Esse mundo virtual trouxe um novo modo de relação entre as pessoas, marcado pelo fechamento sobre si mesmo e pela perda da necessidade do contato real, concreto entre os seres humanos. Tal situação de distanciamento entre as pessoas tem por consequência sentimentos de isolamento e solidão. Crescem os índices de depressão, transtornos de ansiedade e outras patologias do espírito. Fenômeno curioso mesmo esse. Curioso e complexo. Por isso, deixemo-lo para futuras elucubrações. Falei sobre ele a fim de dizer que, como em tudo na vida, nada é totalmente bom nem totalmente ruim.
A internet, com certeza, tem lá seus lados obscuros e perniciosos. No entanto, nela podemos encontrar coisas muito boas. Como exemplo disso - bajulação à parte - tomo a iniciativa do meu querido amigo Luiz Fernando em criar este espaço de veiculação de ideias. Sei de sua inquietação intelectual e também da sua ânsia pelo debate e pela troca de ideias, o que o legitima para ser o autor deste blog.
Se vivemos numa época de esvaziamento das relações entre as pessoas, vivemos também numa época marcada pela futilidade. É comum encontrarmos por aí, com destaque para as redes sociais, pessoas que levam suas vidas numa monotonia bovina, em cujas cabeças há muito não entra uma ideia nova e de cujas bocas só saem obviedades papagaísticas. Coisa triste. Quando não refletimos sobre a nossa condição e situação no mundo, outros irão fazer isso por nós. É batata! Irão mesmo! Aí, já conhecemos mais ou menos no que isso pode dar: expedientes fraudulentos, corrupção, farra com o dinheiro dos pesados impostos que pagamos, autoritarismos, desmandos e uma série de outras coisas do gênero. Sem falar nas besteiras que vamos fazendo ao longo da vida quando são os outros que pensam por nós, quando são os outros que nos governam e ditam inclusive as regras da nossa subjetividade. Geralmente pagamos um preço bem alto por delegarmos o pensamento a terceiros. É triste, mas acontece. E como! Por isso, seja bem-vindo este blog. Que ele possa ser um espaço de autonomia, porque somente quando pensamos é que somos autônomos.

JOÃO PAULO BRAGA FLORIANO
Psicólogo

3 comentários:

  1. Grande adepto da inquietude mundana! Seja bem-vindo ao nosso Blog. Achei pertinente as suas colocações a cerca do mundo virtual. Há uma reificação da rede virtual. E, decorrentes disso, as pessoas estão "emburrecendo". O que é, em última análise, algo muito paradoxal. Afinal, o excesso de informação e acessibilidade é bom ou é ruim? E você, de forma clara, nos propõe essa reflexão. Parabéns!

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  2. Antes tínhamos a família sentada a mesa e discutindo muito sobre relacionamento...
    Depois tínhamos a família sentada a mesa ouvindo o rádio e discutindo pouco sobre relacionamento...
    Há bem pouco tempo atrás, tínhamos a família sentada a mesa vendo TV e discutindo quase nada sobre relacionamento...
    Hoje, com o advento da internet, temos todo mundo falando sobre relacionamento sem saber o que é verdadeiramente uma relação com o próximo.
    Abs,

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  3. Véio, foi isso que disse ao meu amigo e autor deste artigo. O cantor uruguaio disse isso no Programa do Jô: a internet aproxima os que estão longe e distancia os que estão perto. Hoje, há família que se comunica dentro da própria casa via rede virtual. Coisa de doido... rsrsr. Abraços

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